Os melhores do ano

Janeiro é época de balanço, quadra em que, de forma mais ou menos consciente, passamos em revisão o trabalho de um ano. É a estação onde nos sentimos compelidos a seleccionar e eleger os melhores momentos do ano, os instantes quOs melhores do anoe mais nos marcaram, os que deixaram maiores e melhores memórias. Imbuído desse espírito cheguei à organização desta lista muito pessoal, a lista dos dez vinhos que mais me impressionaram ao longo deste ano de 2008. De entre as mais de 5000 referências provadas ao longo do ano, um ano intenso de provas, estes dez foram os vinhos que mais me emocionaram e comoveram.

Porquê apenas dez vinhos? Porque é um número redondo, de fácil apreensão, um modelo com que estamos familiarizados, a base da civilização ocidental. Afinal, não foi por acaso que a humanidade se baseou num sistema decimal. Poderiam ser muitos mais, porque o leque de escolha é vasto, mas o crivo da selecção permitiu apenas a inclusão destes dez vinhos. É uma escolha pessoal e íntima, o espelho fiel do estilo de vinhos que mais me emocionam e comovem. É aqui que assumo o meu gosto pessoal e que desapego o meu gosto individual da tentativa de crítica fria e analítica que qualifica as minhas apreciações.

Não é certamente acaso que este ano a lista dos dez melhores dispense apenas uma referência a vinhos fortificados e que os vinhos brancos desfrutem de uma representação desproporcional face à sua relevância quantitativa e qualitativa. São as condicionantes da natureza, impróprias para declarações de fortificados em 2006, pouco generosas para com os tintos de 2006, os vinhos que chegam agora às prateleiras. Por oposição, assomam agora aos escaparates os brancos de 2007, ano excepcional, quase divino para alguns brancos portugueses.

Os vinhos são apresentados pela ordem alfabética das regiões e, dentro de cada região, pela ordem alfabética dos nomes comerciais, sem qualquer tipo de ordenação qualitativa.

 

VINHOS NACIONAIS:

·         Quinta do Mouro Rótulo Dourado 2005 (Alentejo) – A brutalidade e rusticidade afinal também podem redundar em elegância e harmonia. Virilidade, frescura e delicadeza são os três paradigmas deste tinto tremendo. Afinal o Alentejo pode ser fresco, monumental e duradouro!

·         Vinha Othon 2006 (Dão) – A austeridade e sobriedade são reconhecidas como virtude. A sensação de intemporalidade pode ser terrivelmente sedutora. Uma aparente delicadeza pode encobrir uma têmpera invulgar. O charme indiscutível de um vinho discreto, conservador e elegante.

·         Guru 2007 (Douro) – Potência e amplitude são qualificativos conciliáveis com os predicados elegância e harmonia. A precisão e o rigor matemáticos podem coabitar com a noção de infinito. O Douro pode ser fresco!

·         Maritávora Reserva branco 2007 (Douro) – Mineralidade e frescura levadas ao extremo absoluto. A exaltação de uma vinha centenária, a teimosia de uma família, o arrebatamento da grande paisagem duriense. Pureza e cristalinidade. Um branco triunfal!

·         Poeira 2006 (Douro) – O equilíbrio quase perfeito entre força e contenção. A virilidade temperada pela poesia. Melodia e cadência rítmica irrepreensíveis, fugas e contra fugas temperadas por pequenos desvios líricos. Engenho e inspiração!

·         Robustus 2004 (Douro) – A defesa de uma convicção, a certeza do saber empírico, a vontade de encontrar alternativas, a paciência de saber esperar. A imagem mais desafogada e dramática do Douro. Majestoso e impetuoso.

·         Quinta da Lagoalva de Cima Syrah 2005 (Ribatejo) – O primeiro poiso da casta Syrah, a maturidade de um projecto, a libertação definitiva de um espartilho regional. Amplitude, frescura e contenção. O bom filho a casa retorna!

·         Covela Escolha branco 2007 (Vinho Verde) – Terra e homem em concordância plena. A enunciação clara de um terroir único, um grito de rebeldia e afirmação, a firmeza de princípios. Mistério, subtilezas, nuances, frescura, acutilância. Um branco incomparável.

·         Soalheiro Primeiras Vinhas 2007 (Vinho Verde) – Frescura, intensidade, equilíbrio e harmonia. A expressão máxima da elegância, ritmo e harmonia. O charme discreto da alta-costura. A exaltação da quase perfeição. Apoteótico!

·         Barbeito Malvasia 30 Anos Lote Especial (Madeira) – Exotismo e complexidade, monumentalidade e sumptuosidade. Equilíbrios impossíveis que redundam em êxtase pura. A magia de uma casta, a confirmação definitiva de uma casa. Arrebatador!

13 Comments
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    Frexou

    January 23, 2009 at 14:25

    Falcão,

    Antes de mais parabéns pelo espaço.

    Fico feliz por ver a elevada nota que deste ao Soalheiro PV. É um vinho fantabulástico, que deu um grande salto em relação ao 2006. Foi o melhor branco nacional que alguma vez provei.

    Hoje vou beber um Schloss Gobelsburg Riesling Tradition 2005, que penso que teve 18,5 no teu guia. Eu adoro o perfil deste riesling e mesmo o gruner veltiner não é nada de deitar fora.

    Achas que é vinho para durar largos anos?
    Quando achas que será o melhor momento de consumo?
    Digo isto porque tenho hipótese de comprar algumas garrafas a bom preço.

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    Rui Falcão

    January 23, 2009 at 15:34

    Frexou, obrigado pelas palavras tão simpáticas.

    Pois, pelos vistos partilhamos dos mesmos pontos de vista sobre a superioridade e excelência do Soalheiro Primeiras Vinhas 2007. Como se pode confirmar pela minha apreciação veemente e entusiasta, também o reconheço como um dos melhores vinhos brancos nacionais que tive oportunidade de provar. Segundo a minha avaliação, um dos raros que tem verdadeira estatura universal.

    O Schloss Gobelsburg Riesling Tradition 2005 foi classificado com 17,5/20 no meu guia do ano passado. Reparei agora (ao confirmar as minhas notas) que, por regra, tenho preferido o Gruner Veltliner Tradition à edição Riesling. Provavelmente por achar que a casta Gruner Veltliner se adapta melhor ao princípio filosófico que norteia o vinho, a oxidação forte na fase inicial de vida.

    Respondendo à pergunta em concreto, imagino que o Tradition seja o vinho com maior potencial de longevidade do “Michi” Moosbrugger. Tenho alguma experiência com vinhos velhos de Schloss Gobelsburg, desde o início da década de cinquenta, pré Michi Moosbrugger, mas este rótulo em particular nasceu apenas na vindima 2004, o que dificulta a obtenção de qualquer conclusão definitiva. Por ora, só posso tentar adiantar conclusões baseadas em “feelings” e considerações lógicas, com todas as incertezas que esses “vaticínios” acarretam…
    Pessoalmente não hesitaria em comprar muitas garrafas, mais a mais quando o preço se apresenta simpático!

    Abraço,

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    João de Carvalho

    January 23, 2009 at 18:48

    Caro Rui

    Antes de mais desejar votos de maior sucesso para o site.

    Quanto ao Soalheiro Primeiras Vinhas 2007, parece não ter deixado ninguém indiferente, afirmando-se à segunda colheita como um dos grandes vinhos de Portugal.

    Ao atribuir 19 valores ao Soalheiro Primeiras Vinhas coloca o vinho num patamar ao nível do melhor que se faz no mundo (justamente merecido).

    Tendo em conta a sua ”paixão” pela casta Riesling, com que grandes brancos da Alemanha se pode equiparar este nosso Alvarinho ?

    Com os melhores cumprimentos
    João de Carvalho

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    Rui Falcão

    January 23, 2009 at 19:08

    João,

    Obrigado pelas palavras simpáticas de incentivo.

    Confirmo que considero o Soalheiro Primeiras Vinhas 2007, como um dos belíssimos vinhos brancos do mundo.

    Tentando responder à pergunta em concreto, creio que o Soalheiro Primeiras Vinhas não pode, nem deve, ser comparado com qualquer branco alemão, muito menos da casta Riesling. Não existem pontos comuns que possam unir o Soalheiro com os muitos perfis alemães.

    E esse é um dos pontos mais interessantes do Soalheiro Primeiras Vinhas, a sua “portuguesidade”, o carácter profundamente minhoto, a expressão de uma casta, de uma filosofia e de um sítio. Por ser um vinho único e inimitável, para além de todas as muitas virtudes, é que o Soalheiro Primeiras Vinhas é tão notável e excepcional.

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    João de Carvalho

    January 23, 2009 at 19:51

    Concordo plenamente com o que foi dito.

    A minha questão era meramente no plano da qualidade, ou seja, tendo em conta os 19 valores atribuídos, que outros vinhos poderíamos encontrar num mesmo plano de excelência.

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    Rui Falcão

    January 23, 2009 at 20:26

    João,

    A resposta é mais ou menos intuitiva para quem tiver comprado o meu guia de vinhos deste ano. Basta folhear os resumos das páginas finais, sobretudo na página 487, com a indicação dos “Top Estrangeiros”, para descobrir quais os vinhos que no guia deste ano mereceram nota igual ou superior a 19/20 (classificação auferida ao Soalheiro Primeiras Vinhas 2007). Estão nessa situação doze (12) vinhos estrangeiros e sete (7) vinhos nacionais…

    Abraço,

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    Frexou

    January 24, 2009 at 00:25

    Rui,

    Peço desculpa pelo lapso, pensei que tinhas dado 18,5 ao Tradition 2005. Tenho ideia de ter visto no teu guia 2009. (ainda não o comprei, aliás ainda não comprei nenhum de 2009)

    Mesmo assim um 17,5 é sempre uma excelete nota para um branco abaixo dos 20€.

    Em relação ao Primeiras Vinhas, concordo em absoluto no distinto perfil em relação aos Riesling’s. O único ponto que lhe consigo encontrar é a acidez quase perfeita e a facilidade com que se deixa embalar no copo. É um vinho quase perfeito.
    Quando como sushi (sim, cá no Porto já começa a haver um culto pela comida nipónica, leve, pura e muito delicada)não encontro melhor parceiro.
    No entanto a duvida persiste quanto à evolução do vinho. É sabido que alguns Alvarinhos, sobretudo os Soalheiro, aquando da sua evolução tendem a aproximar-se do perfil dos Riesling’s Alemães, com aromas de querosene, muito finos, minerais e profundos. Achas que este vinho irá evoluir dessa forma?
    A minha pergunta não faz muito sentido, pois eu não consigo guardar nenhuma garrafa de Soalheiro PV…

    Aponta por favor dia 20 de Fevereiro na tua agenda. Por mail explico-te porquê.

    Abraço

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    Rui Falcão

    January 24, 2009 at 09:30

    Frexou,

    Indiscutivelmente, segundo a minha escala, uma classificação 17,5/20 é uma nota excelente. Aliás, basta recordarmo-nos de todo o nosso percurso académico, para facilmente reconhecermos que este tipo de nota sempre esteve reservada para os alunos verdadeiramente excelentes. Penso que o mesmo se deve passar com os vinhos. Devemos ter o cuidado de não banalizar as notas demasiado elevadas, sob pena de estarmos a nivelar por baixo todos os vinhos… penalizando os melhores.

    Bom, nesta fase, com apenas duas colheitas no mercado, é impossível avançar com afirmações categóricas sobre a evolução do Soalheiro Primeiras Vinhas. Mas, tentando responder à pergunta, e apesar do exercício incluir alguma adivinhação, arrisco afirmar que o Soalheiro Primeiras Vinhas 2007 será o Soalheiro com maior capacidade de guarda de sempre. Este é um dos brancos portugueses que merece ser guardados em garrafas magnum… deixando-o esquecido na garrafeira! Concordo em absoluto com a mineralidade cristalina dos Soalheiro “normais”, com a evolução muito positiva, embora pessoalmente, sinta dificuldade em descobrir paralelismos com os muitos perfis alemães da casta Riesling. Admito que seja uma falha minha, mas não consigo descobrir pontos de contacto entre os Soalheiro do passado (e presente) e os muitos perfis da casta Riesling na Alemanha. A querer encontrar pontos de identificação internacionais, teria maior facilidade em avançar para alguns Sauvignon Blanc austríacos, oriundos do sul da Estíria. Mas admito que esse seja um exercício escusado, precisamente porque a autenticidade regional é uma das grandes virtudes do Soalheiro.

    Como compreendo a dificuldade em guardar garrafas do Soalheiro Primeiras Vinhas…

    Abraço,

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