Kopke 375

São poucas as marcas centenárias, os nomes que perduram para lá das duas primeiras gerações, as referências que se mantêm ao longo de mais de cem anos. Os casos de sucesso continuado no tempo são raros e ainda mais insólitos quando governados por uma escala de tempo que extravase o marco mais difícil, os primeiros cem anos de vida. São ainda mais raros os casos de pujança, ou de simples sobrevivência, após os primeiros duzentos anos de vida… e ainda mais escassos os casos que transbordam a meta simbólico dos primeiros trezentos anos, fronteira cuja transposição se assevera quaseDouro impossível.

Um marco histórico de que poucas empresas nacionais ou internacionais se podem orgulhar seja qual for a actividade ou ramo económico a que se consagrem. Mesmo no mundo do vinho, que por natureza sempre se destacou por defender e reverenciar uma dose elevada de conservadorismo, poucas empresas conseguiram, conseguem ou conseguirão atingir tal fronteira temporal. O produtor de vinho mais antigo do mundo está em França e chama-se Château de Goulaine, produtor na região do Loire, tendo sido estabelecido no ano 1000, na transição do primeiro para o segundo milénio.

Longe de constituir excepção o feito da família Goulaine inscreve-se no registo intemporal de um punhado de outras famílias europeias que perduram e perpetuam a sua paixão pelo vinho ao longo do tempo, famílias como os Ricasoli de Siena, Toscânia, que se orgulham de ser a quarta empresa familiar mais antiga do planeta, produzindo vinho ininterruptamente desde o ano 1142. Brio partilhado pelas famílias Antinori da mesma região italiana que fundou as operações vitícolas no ano de 1385, pela família francesa de Sarret de Coussergues que detém o Château de Coussergues, no Languedoc, fundada em 1494, ou ainda da famosa família Codorníu, em Espanha, estabelecida em 1551.

Apesar destes números avassaladores pela longevidade pouco frequente, os valores da perenidade e intemporalidade do vinho também estão presentes em Portugal… e não permitem aflorar qualquer complexo de inferioridade. Também entre os produtores portugueses florescem os casos de empresas de sucesso continuado e de longevidade colossal, marcas e produtores que medem a sua existência em séculos desafiando desta forma a lógica da vida. Nenhum sector do vinho lusitano porém mantém tal vivacidade e desembaraço como o Vinho do Porto, estirpe familiar que alberga a maioria das marcas históricas que mantêm nomes e rótulos que persistem numa matriz quase eterna.

Entre todas surge o nome da casa mais antiga do Vinho do Porto e seguramente uma das casas mais antigas na produção de qualquer tipo de vinho em Portugal, a Kopke, conhecida precisamente como a casa de Vinho do Porto mais antiga ainda em exercício. Uma casa que comemora este ano um dos maiores feitos possíveis para qualquer empresa, seja ela do mundo do vinho ou de qualquer outra actividade económica, 375 anos de produção contínua, empreitada homérica a que nenhuma outra casa de Vinho do Porto pode por ora aspirar.

Uma data épica que obrigou a uma comemoração também ela épica e exemplar. E que melhor oportunidade poderia uma empresa de Vinho do Porto pedir para aproveitar para lançar um vinho estrepitoso, um vinho que condensasse os primeiros 375 anos de vida daquele que é um dos nomes de referência do Vinho do Porto, um dos raros vinhos do mundo que todos, sem excepção, incluem entre os cinco grandes vinhos do mundo? Foi esse o propósito da Kopke ao lançar agora o vinho de nome homónimo, o Kopke 375, um Vinho do Porto de tiragem muito limitada, justamente 375 garrafas numeradas como seria de esperar, vinho que pretende assinalar a data com a pompa e a circunstância que a data exige.

PortoUm vinho caro e raro com um preço de retalho sugerido de 680€, um vinho especial que se inclui entre os recentes lançamentos de vinhos do Porto de luxo, vinhos raros e excepcionais que, apesar do lamento de alguns que se queixam dos preços demasiado elevados, são propostos a preços perfeitamente condignos com a raridade e a qualidade excepcional da maioria destes novos lançamentos de vinhos muito antigos… que tanto têm ajudado na tentativa louvável de recuperar a imagem de prestígio e exclusividade que sempre deveria ter estado intimamente associada ao nome Vinho do Porto.

Curiosamente, e talvez inesperadamente tendo em conta a grandiosidade e pompa da data a comemorar, o vinho escolhido para representar a efeméride recaiu num Kopke Colheita de 1940, vinho que a casa já tinha comercializado anteriormente com o designativo Colheita e de que aparentemente ainda possui um número não negligenciável de pipas com as contas correntes devidamente oficializadas junto da tutela e que atestam e certificam a origem.

Para distinguir o vinho dos seus antecessores comerciais, e simultaneamente para afinar o estilo pretendido nesta edição especial a equipa de enologia da Kopke selecionou uma das pipas mais consideradas onde o vinho esteve em repouso durante 73 anos, trasfegando o vinho para uma pipa de madeira ainda jovem, com pouco mais de sete anos de utilização, e consequente ainda pouco marcada e avinhada pelo Vinho do Porto. Rejuvenesceu-se desta forma o Colheita 1940 com um pouco de aguardente virgem, aguardente caseira propositadamente envelhecida para estas ocasiões, adensando o estilo truculento desta edição comemorativa garantindo um perfil mais entroncado, assertivo e viril, renovando e reformando quase por completo o recorte inicial deste Colheita 1940.

Vale a pena procurar este vinho e reflectir um pouco sobre as razões e circunstâncias que contribuem para que o Vinho do Porto seja um dos melhores vinhos do mundo… sem que o reconhecimento comercial e a recompensa material se concretizem na produção.

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