Rui Falcão on January 12th, 2009

Já aqui falei do Vallado no passado, da Quinta do Vallado, produtor duriense de créditos firmados, parte capital da revolução enológica do Douro, da afirmação internacional dos vinhos do Douro. Falei do Vallado para elogiar a consistência, para aplaudir a qualidade, para celebrar a quantidade e disponibilidade do vinho, e, sobretudo, para louvar a tremenda relação qualidade/preço do vinho base, precisamente o Vallado. Um rótulo que, ano após ano, sempre oferece vinhos belíssimos vendidos a preços mais que justos. O paraíso de todos os consumidores.

Hoje volto ao Vallado para falar de um vinho novo, uma nova aposta, um tinto que se coloca no extremo oposto do espectro económico, o Adelaide. Um vinho caro e raro, um rótulo que será lançado apenas em anos excepcionais, um tinto elitista que, seguramente, será bicudo de encontrar. Um mundo de diferenças! Só a qualidade e o grau de exigência continuam a ser um preceito comum, como aliás de todos os vinhos da Quinta do Vallado.

Quinta do Vallado que nasceu para o vinho em 1987, aquando da venda da empresa Ferreira. Enfim, mais propriamente nasceu para o vinho com nome próprio em 1987, porque a quinta existe desde 1716 e sempre fez vinho. É pertença da família Ferreira desde 1821, desde os tempos de Dona Antónia Adelaide Ferreira, a ilustre Ferreirinha, e manteve-se na posse da família, hoje já na sexta geração, fora do acordo de venda da Ferreira. De repente, uma quinta que sempre fez Vinho do Porto para terceiros, como a quase totalidade das empresas da região, viu-se na contingência de mudar de vida, de fazer uma marca, de reestruturar vinhas, de racionalizar uma adega. Não foi fácil começar do zero. Mas, 20 anos passados, os resultados são animadores.

Começaram com uma produção de 80.000 garrafas, hoje já se aproximam do importante patamar psicológico das 500.000 garrafas. Nasceram com uma oferta inicial de 3 vinhos, hoje já conseguem proporcionar 12 vinhos por entre brancos, rosados, tintos e dois Porto. E agora, iniciaram uma segunda reestruturação com a compra de uma nova quinta de 30 hectares no Douro Superior, uma quinta virgem, sem vinha, terreno a desbravar com total liberdade. Na Quinta do Vallado está entretanto a nascer uma nova adega, uma adega moderna e funcional, bem como uma nova cave subterrânea de barricas, uma necessidade absoluta para o estágio dos vinhos tranquilos e dos novos Porto que têm ganas de vir a fazer.

O que é que o Adelaide tem a ver com isto? É o vinho ícone que pretende celebrar e personificar este espírito de excelência e de mudança. É também uma homenagem sentida da família a Dona Antónia Adelaide Ferreira, consubstanciada em Francisco Ferreira, João Ferreira Álvares Ribeiro e Francisco Olazabal, os responsáveis directos pela condução dos destinos da Quinta do Vallado. Mas fazer um vinho ícone não é coisa fácil nem imediata. Os últimos anos foram passados a explorar a vinha velha, os quase 8 hectares de vinha velha que resistem e subsistem na Quinta do Vallado. Foram anos de tentativas e erros, de ensaios e experiências, de alegrias e frustrações, na procura incessante do talhão ou talhões, que mais e melhores garantias pudessem oferecer. Tarefa dificultada pela vasta área da vinha velha e pelas mais de cinquenta castas que por lá descobriram.

Não foi instintivo nem intuitivo mas chegaram a bom porto. Os anos de ensaios e observação permitiram seleccionar um talhão com quase um hectare, uma vinha já centenária, virada a poente, numa exposição privilegiada sobre o Douro. Uma vinha densa, riscada à moda antiga, com 7.000 pés por hectare, uma vinha de castas misturadas, neste lote em particular com predominância de Tinta Amarela, Tinta Roriz, Tinta Barroca e Touriga Francesa. Mas, como entretanto já identificaram mais de uma dezena de castas, a influência de cada fica diluída dentro do espectro mais vasto do terroir. Vinhas velhas necessariamente pouco produtivas, com não mais de dois ou três cachos por pé. Ou seja, nada, quase-nada!

Afinal, deste hectare de vinha não vão sair mais de 1.800 garrafas, das quais só uma pequena parte se vai quedar em Portugal. Filantropicamente, e seguindo a tradição benemérita iniciada por Dona Antónia Adelaide Ferreira, duzentas das 1.800 garrafas produzidas vão ser oferecidas e leiloadas em hasta pública, com a receita a reverter para uma instituição duriense de apoio social. O Adelaide vai ser caro? Sim, muito, muito caro! Mas se atentar em todos os detalhes descritos, e, sobretudo, se souber que o Adelaide 2005 é de facto um vinho superior, então o investimento poderá fazer sentido. Com uma certeza pode contar – o Adelaide 2005é seguramente um vinho muito especial!

Rui Falcão on January 11th, 2009

As colheitas mais recentes, as que estão no mercado, são sempre as melhores! Ano após ano, vindima após vindima, esta é uma realidade incontornável na boca de qualquer produtor. Se 2003 foi o melhor ano de sempre, logo 2004 e 2005 o substituíram como o ano das grandes revelações, consagrando-se como anos de eleição. Agora é 2007 a surgir como a melhor colheita da década, um ano excepcional para tintos, um ano inigualável e extraordinário para brancos. Fortuitamente, a maioria vai abster-se de omitir considerações Colheitasobre a colheita de 2006, abstraindo-se de dissertar sobre esse ano fatídico. As razões são evidentes. O ano de 2006, funesto para a maioria dos produtores, foi um ano conturbado, um ano difícil, que alternou entre os escaldões de calor tórrido e a hecatombe das chuvas torrenciais na altura da vindima. Por isso, poucos produtores quererão falar abertamente sobre 2006. Por isso, no seu discurso estruturado, todos terão vindimado antes das chuvas, todos terão beneficiado de uma micro-exposição extraordinária, de um micro-clima generoso que os protegeu do calor…

E, goste-se ou não, a colheita de tintos que está no mercado é precisamente a de… 2006! Já em 2007 todos, sem excepção, terão tido o melhor ano da década… se não do século! Esta é a versão da maioria dos produtores, uma versão lógica e imbuída da necessidade de louvar e vender os seus produtos.

A colheita de 2006 foi então um ano dramático, um ano horrendo, onde a paciência de viticultores e enólogos foi duramente testada. Depois de um ano seco e quente, quase escaldante, um ano de stress hídrico, um ano em que as videiras suspenderam o ciclo vegetativo para salvaguardar o futuro, as chuvas constantes na vindima acabaram por condenar o ano agrícola. Quem vindimou antes das chuvas colheu fruta demasiado “quente” e torrada pela inclemência do sol. Os graus alcoólicos dispararam. Quem vindimou durante e após as chuvas diluvianas que assolaram Portugal na altura das vindimas, colheu muita podridão, muita diluição, muitas agruras. Foram demasiadas contrariedades para que 2006 possa ser considerado um ano interessante. Sim, necessariamente também existem bons vinhos em 2006. Mas a qualidade média é desoladora e os vinhos de excepção não abundam. É triste, mas é a dura realidade.

Finalmente arribamos a 2007, um ano absolutamente atípico, um ano que, ao contrário do provérbio, nasceu torto mas endireitou-se. O Inverno começou chuvoso e a Primavera continuou húmida, com alternâncias constantes entre sol e chuvisco. Pouco tardou até que o Míldio e o Oídio atacassem em força. Quem foi fazendo os muitos tratamentos preventivos necessários, caros e fastidiosos, salvou o ano. Os outros sofreram e, em muitos casos e em perfeita calamidade, perderam colheitas por inteiro. Sobretudo nas regiões menos acostumadas ao Míldio e Oídio, como o Douro Superior. O Verão foi fresco, muito fresco, como não há memória. Temperaturas amenas que permitiram uma maturação lenta e perfeita, sem sobressaltos, sem stress, sem contratempos de qualquer espécie. O tempo estável durante quase toda a vindima permitiu uma colheita extraordinária em todo o país, excepcional na qualidade, razoável na quantidade. Só uma pequena parte do Alentejo, nas cercanias de Estremoz, fugiu à estabilidade meteorológica na altura das vindimas. Podemos pois esperar vinhos excepcionais na colheita 2007, vinhos equilibrados e harmoniosos, vinhos ajuizados e bem proporcionados.

Por enquanto, são sobretudo os brancos de 2007 e os tintos de 2006 que estão no mercado. Como regra, e digo-o com algum constrangimento, não poderá esperar muito dos brancos e tintos de 2006, com as devidas excepções que confirmam a regra. Em contraponto, os brancos de 2007 já presentes no mercado, são, em muitos casos, absolutamente deliciosos. Alguns são mesmo excepcionais, vinhos extraordinários no carácter e qualidade, vinhos de qualidade ímpar. Os tintos de 2007 já presentes no mercado são os tintos mais jovens, pouco consentâneos com padrões qualitativos elevados. Para poder provar os melhores, ainda vai ter de esperar um ano. E aí vai descobrir a bênção dos céus. Espere pois bons vinhos brancos de 2007 e um ou outro belíssimo tinto de 2006. Para saber quais basta continuar a ler estas crónicas ao longo do próximo ano…

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